terça-feira, 23 de março de 2010

The Yes Men - Corretores de identidade


Uma vez não é costume, vou falar de um documentário fantástico que vi há uns anos atrás: The Yes Men (http://pt.wikipedia.org/wiki/Yes_Men). Eles de autonomeiam “corretores de identidade” no sentido de correção, expondo o que eles acham ser a verdadeira cara do liberalismo que busca o lucro a qualquer custo, através de “pegadinha” gigantescas e muito bem feitas. Eles já têm 2 filmes publicados, embora sejam filme difíceis de encontrar pois ambos são produções independentes pagas pelas contribuições de internautas e outros benfeitores.

Eu vi o primeiro filme e achei fantástico pois eles conseguem expor uma série de situações que nós, espectadores distraídos deixamos passar facilmente. A primeira grande farsa que eles tiveram a ousadia de fazer foi simplesmente de clonar o site da campanha do George Bush, durante as presidenciais de 2000. Mas o clone ficou um pouco diferente do original. Embora eles tenham mantido as cores, fotos, organização geral do site, o conteúdo era muito diferente. Por exemplo, onde o site original do Bush dizia que a sua política ambiental visava à proteção dos recursos naturais etc., o clone dizia que ele não estava nem aí para o protocolo de Kyoto, que ia continuar a explorar o petróleo dentro e fora de casa etc. Entendem o conceito de “correção de identidade”? Essa brincadeira fez com que o Bush dissesse que “deveria haver limites à liberdade”. Isso mesmo, leram bem. Procurem no youtube e de certeza encontrarão essa perola.

Mas o documentário não é só isso. Muitas outras entidades têm as suas “identidades corrigidas”:

  • a Dow Chemical (antiga Union Carbide) reconhece a sua culpa pela catástrofe em Bhopal - http://pt.wikipedia.org/wiki/Desastre_de_Bhopal 
  • a OMC (Organização Mundial do Comércio) reconheceu que a liberalização do comércio só contribuiu para o aumento da desigualdade entre países pobres e ricos – ricos cada vez mais ricos e pobres cada vez mais pobres
  • Centenas de executivos da ExxonMobil comemoraram a continuidade da exploração dos combustíveis fosseis garças ao projeto Vivoleum que prometia fazer combustível a partir dos cadáveres dos milhões de mortos oriundos de catástrofes globais – sim, parece inacreditável, mas foi assim mesmo.
  • Em Novembro de 2008 uma edição extra do NY Times anunciou o fim da guerra no Iraque e provocou um curto momento de euforia e felicidade nas ruas de Nova Iorque, até as entidades oficiais desmentirem a noticia.
  • Etc...


Eles trabalham unicamente com ajuda de voluntários e doadores, ajuda quem pode e como pode. Quem nunca viu esse documentário, e gosta do Michael Moore sem o sensacionalismo, então não perca: The Yes Men.

quarta-feira, 17 de março de 2010

E o voto consciente?

Como venho de outro país, é para mim interessante observar o Brasil e o seu voto obrigatório, uma coisa que muitos em Portugal acham ser a solução para o engajamento do povo. Aqui, isso já não é visto de tão bons olhos, pelo que percebi, pois dá azo a esquemas de “compra/venda” de votos etc. 

Uma coisa eu sempre achei, quem não vota não deveria ter direito de se queixar, de manifestar indignação etc. Apesar de tudo o voto ainda é o único instrumento que o cidadão tem para manifestar a sua opinião, por mais que como já falei em outro artigo, a gestão pela maioria não seja a melhor. Mas é sempre milhares de vezes melhor que a autocracia, certo? Então quem não usa do seu poder discricionário de fazer valer a opinião quando lhe é dado o espaço, de alguma forma coloca o seu voto no cesto da maioria. Na verdade o voto nulo ou o voto em branco têm o mesmo efeito.

O que é o voto consciente, então?
  • É ter a noção da importância do voto, da sua voz, no exercício da cidadania.
  • É se interessar pelos fatos da política, pelo que realmente é feito pelos representantes eleitos, sem se deixar ludibriar por demagogia ou pela máquina de marketing dos políticos.
  • É cobrar dos políticos a transparência na gestão e no exercício dos seus cargos.
  • É ser participativo na cobrança da materialização das promessas feitas durante os períodos de campanha.
É isso e muito mais, mas de uma forma simplificada podemos resumir o voto consciente em “votar, com conhecimento de causa”.

E isso tem sido muito difícil, pois no mundo inteiro a classe política sofre de um descrédito gigantesco, muito devido aos podres e jogos de poder que ela mesma engendrou. E, quantas vezes eu ouvi dizer que no Brasil é ainda pior que no resto do mundo? Acreditem que não é. Vivi em França, Portugal, Angola e Espanha, e se tivesse que reduzir as minhas descobertas a uma só, seria precisamente que a corrupção é a mesma em todos os lugares, só que com cara e maquiagens diferentes.

E isso é terrível, pois quanto menos o povo acredita no político, mais distante fica dele, e mais espaço deixa precisamente para que a corrupção entre e prospere, incólume, livre de qual trava estrutural.

A única solução é a educação de quem vota, informação para todos, e instalação de ferramentas que permitam monitorar toda a máquina política. Enquanto isso não acontece, só resta cada um tomar a sua responsabilidade com a seriedade que ela exige.

segunda-feira, 8 de março de 2010

As incongruências do dia da mulher no sec. XXI

Todos os anos quando chega este dia, ao dar parabéns a algumas das mulheres que me rodeiam, deparo-me com a dupla incongruência desta data. Primeiro, por ser apenas um dia por ano: isso me lembra os outros dias especiais do calendário, dia da gentileza, dia da cortesia, dia internacional do civismo, dia do respeito etc. Não é acham ridículo isso? Só um dia por ano para ter atitudes básicas de civismo entre mulheres e homens? Segundo, por não existir o dia do homem. Por mais que algumas já tenham a resposta pronta “mas TODOS os outros dias são o dia do homem nesta sociedade machista e misógina!”, não deixa de ser mais uma demonstração de iniqüidade. Todos os dias do calendário deveriam ser os dias dos seres humanos! Só isso.

O mais fascinante é que quase ninguém se lembra porque o dia 8 de março é o dia da mulher, qual o motivo histórico para tal. Quem estiver interessado em saber mais: http://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_Internacional_da_Mulher. Essa falta de contextualização histórica provoca, em minha opinião, algumas distorções absurdas. O dia da mulher virou o dia em que se faz manicure, salão, massagem etc. De todas as manifestações que tenho visto – inclusive na empresa onde eu trabalho, a conotação política e social do dia é completamente esquecida em favor de manifestações mais parecidas com o “natal das mulheres” ou com o dia dos namorados. Isso é péssimo, pois não contribui para a tão famosa mudança cultura que tanto se espera. Pelo contrario, perpetua-se o modelo vigente – machista – reforçando o a idéia que a mulher só pensa nas unhas, pele, cabelo e outros atributos supérfluos quando comparados com as conquistas passadas e futuras.

Recapitulando: o dia da mulher é um dia para celebrar as conquistas, mas também e, sobretudo, é um dia para refletir no caminho que ainda resta a percorrer até que se obtenha um semblante de eqüidade no tratamento dos gêneros na sociedade. Não tenho nada contra oferecer manicure, pedicura, massagem etc (na verdade, como para os outros dias nomeado acima, só fico com pena que seja apenas 1 dia no ano). O que me parece ser importante é que se aproveitem dessas manifestações para provocar mais avanços para a causa.

PS: hoje, precisamente hoje, vi na TV que o jogador Adriano bateu na mulher, e outro colega de time dele defendeu-o com um nível de ignorância que até dói: "quem de vocês jornalistas nunca saiu na mão com a esposa?". Eu sei que futebol nunca foi sinal de inteligência, mas espero que este tipo de declarações sejam em breve consideradas crime, como as que incitam ao ódio racial...