quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Abandono de bebês...

No outro dia fui ao hospital por causa de uma dor de garganta que não passava há um mês. Enquanto esperava pelo meu atendimento, distraidamente eu olhava para a televisão. Era final da tarde e passava uma emissão num canal público que eu não conhecia. O tema tratado nesse dia parecia ser “bebês abandonados” ou algo assim, porque durante as duas horas que esperei o apresentador não falou de outra coisa. Usando como fio condutor o caso de uma senhora que tinha encontrado um bebê numa lixeira, a emissão levantou vários casos similares, dos mais escabrosos aos mais felizes. Mostraram imagens de arquivo de pessoas que encontraram bebês mortos em sacolas de lixo, imagens de câmeras de segurança onde tentam identificar as pessoas que abandonam, havia até gente que filmou enquanto encontrava a(s) criança(s), como se antecipadamente soubesse que esse seria o seu passaporte para a fama. Tudo isto ia sendo metronomicamente interrompido por pedaços de entrevista da senhora que tinha acabado de salvar a criança, onde esta apenas manifestava que ela não era nenhuma heroína, que apena se tinha limitado a fazer o que o bom senso ditava.

O público que esperava pela sua vez no átrio do hospital, como eu, acompanhava tudo com uma atenção meticulosa alimentada pelo voyeurismo natural que temos em nós, pontuando aqui e ali o silencio do hospital por manifestações hora de nojo ou rejeição, hora de aceitação e conivência, dependendo do que a TV mostrava no momento. Num momento em que o programa apresentava imagens de uma câmera de segurança, que mostrava uma mulher abandonando um bebê na guarita de um predio residencial de Brasília, um dos presentes na sala exclamou algo como “deveria ser fuzilada ou mandada para sempre para Carandiru...“.

Eu confesso que, no meio de tantas demonstrações de desprezo, a única coisa que eu consegui pensar dessas mulheres e homens (sim, homens, e não eram poucos) que abandonavam os bebês em rios, florestas, lixeiras no meio da cidade, entradas de shopping etc. é “coitados”. Pois. Coitados. Porque eu parto do pressuposto que ninguém abandona um bebê sem sofrimento. Assumir que todas as pessoas que abandonam bebês ou crianças são psicóticos desprovidos de sentimentos parece-me sem sentido, alem de ser confortavelmente arrogante. Ou arrogantemente confortável, como quiserem. Sim, a lei das probabilidades diz que certamente entre esse grupo existem pessoas absolutamente sem escrúpulos ou consciência. Mas daí a assumir que são todas ou mesmo que é a maioria, vai um mundo. Se assim fosse, essas pessoas matariam as crianças. Mas não o fazem, correto?

Eu tenho precisamente a sensação que a maioria chega à decisão do abandono quando já esgotou todas as outras opções, quando já pensou em quase todas as outras possibilidades. Na verdade não pensou em todas. Só que ao crescer, ao nos tornarmos “adultos” parece que perdemos a sapiência de pedir ajuda. Pedir ajuda é um sinal de fraqueza, sobretudo nas sociedades modernas. Então só resta o abandono, só resta largar a criança num lugar qualquer e esperar uma de duas coisas: que alguém encontre antes que seja tarde demais ou que a criança morra depressa e sem sofrimento, como se alguma dessas duas situações fosse aliviar o peso da decisão.

Não tenho resposta para esse tipo de situação. Não sou psicólogo nem sei que tipo de ajuda poderia ser dada. Mas tenho o sentimento que a repressão é de longe a pior resposta possível. Essas pessoas precisam de ajuda. Consideramos drogados como doentes e pessoas que abandonam crianças não? Onde está a linha que separa um tipo do outro? Quem é o juiz dessa sentença?

4 comentários:

  1. Olá gostei do seu site e da sua atitude,gostaria que você desse uma olhada no meu site e lesse meus textos se possivel,quem sabe nossas ideias são parecidas,acho que unindo pessoas com os mesmos ideais a gente acaba se fortalecendo cada vez mais.O endereço do site é www.mundoideal.net.br

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  2. Olá Thomas!
    Muito obrigado pela sua visita e seu comentário. Espero que volte sempre.
    Gostei do seu site e também achei que podemos colaborar. Este blog aceita participações de terceiros, sempre que possível! Grande abraço!

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  3. Tema complicado. Eu, em minha posição de me considerar uma super e ótima mãe, sempre assisto à esse episódios com muita angústia e me questiono o que leva uma pessoa a abandonar um ser tão frágil. No caso das mulheres, quase sempre recorro à depressão pós parto, assim soluciono rápido a questão e paro de pensar. Creio que o medo do juízo de valores, que nos torna tão arrogantes, seja a causa para que muitos não peçam ajuda, medo de se declararem imperfeitos e que em algum momento não conseguiram, mal sabem que os "perfeitos" escodem muito mais humanidades.

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  4. Valéria, na minha humilde opinião a depressão pós parto não é razão para abandonar uma criança. Parece-me ser algo ao mesmo tempo mais simples e mais difícil de resolver: falta de condições, de educação, de informação, medo da lei no caso do aborto...é uma discussão longa. Em caso nenhum eu computo DPP como uma razão plausível e crível...antes fosse. Seria bem mais simples de tratar.

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