quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Gênios bons e gênios maus...

É. Leram bem. O texto é sobre esse tema mesmo. Já faz algum tempo que não escrevo no blog, muito por causa da minha péssima gestão de tempo. Espero que me desculpem :)

Há uns meses atrás eu lia ou via na TV sobre um traficante de droga que acabara de ser preso. Após a prisão dele, a policia descobria pouco a pouco toda a rede montada para suportar o “negócio”: onde o produto era fabricado, como era comprado, onde era entregue para transformação, como era manuseado e empacotado, as rotas de distribuição para a sua rede local, como os clientes sabiam da chegada (publicidade viral), como pagavam, como o dinheiro era controlado e lavado, como funcionava o sistema de remuneração dos intervenientes da cadeia de produção e distribuição, partilha de lucros, gestão da força de vendas (força literal), proteção e expansão de território etc, etc. Um operação assustadoramente complexa, gerida a partir de um esconderijo, com um caderno e um lápis.

Ao observar toda a apresentação eu me lembrei da trilogia The Godfather (O Poderoso Chefão). É um dos meus filmes preferidos e acendeu um fascínio pela máfia e o crime organizado. Fascínio voyeurista, ok? Não tenho mínima vontade nem intenção de ser criminoso, como devem imaginar. Mas fico abismado como essas organizações funcionam tão eficientemente, da visão empresarial da coisa, apenas estão do lado errado da lei. Este “do lado errado da lei” me fez sorrir ironicamente agora. Quantas vezes já vimos empresas “do lado certo da lei” cometer delitos com efeitos tão graves e odiosos quanto os da máfia, com base no mesmo sentimento partilhado pelos lordes da droga: ganância! Vêm-me à memória o escândalo da Enron, por exemplo. Mas adiante. Provavelmente isso é assunto para outro texto.

O economista Steven Levitt e o escritor Stephen Dubner, co-autores do Freakonomics (se não leram ainda, aconselho), fizeram entre outras coisas bem interessantes, a comparação entre o funcionamento de uma operação de narcotráfico e de uma empresa. As similaridades são impressionantes. Mas eu não quero me estender nesse quesito. A minha dúvida é outra. Eu pergunto-me se esses mafiosos ou bandidos funcionariam bem “no lado bom da força”, entendem? Será que se a gente pegasse num Fernandinho Beira-Mar e entregasse a gestão de uma empresa, ele teria sucesso? Quantas vezes a gente disse de tal bandido “que pena que ele não é do bem!”. E se fosse? Será que o gênio de uma pessoa é independente da sua ética, dos seus conceitos morais, do seu civismo? Ou melhor dizendo, será que se mudarmos a variável “ilegal” para “legal”, o problema ficaria resolvido? Não tenho resposta para esta questão. Pronto, está dito.
 
Prometo um texto mais feliz antes do fim do ano ;)
 
Abraços!

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

O mercado da sustentabilidade

No outro dia eu recebi o link deste artigo do blog do Ethos “Sustentabilidade tem valor no mercado”. Trata-se da publicação de um relatório de pesquisa da McKinsey sobre como o tema é visto/percebido dentro do universo empresarial.

Aconselho a leitura detalhada do artigo a todos que se interessam ao tema. O resumo em grandes linhas é:
  • O assunto continua ganhando visibilidade e importância estratégica
  • O motivo de tratar do tema já não é tanto a questão de marca e reputação
  • A abordagem é sobretudo ambiental
  • Conclusão: “as empresas brasileiras passaram a enxergar a sustentabilidade como uma alavanca para a geração de valor”
Confesso que fiquei feliz em ler essa avaliação. Normalmente sou bem cético perante essas visões otimistas do mundo empresarial. Ainda acho que o que prevalece é a lei do lucro – item importante, mas não único para a sustentabilidade. Concordo que o tema veio para ficar, mas ainda tenho algumas dúvidas quanto aos reais motivos do mundo empresarial. Fico feliz por saber que pelo menos a importância cosmética do assunto deixou de ser priorizada pelas empresas, mas ao mesmo tempo, como eu tratei em outro texto (link para os riscos de greenwashing), os riscos de abordagem errônea são imensos. Aliás, sempre que leio as palavras “sustentabilidade” e “mercado” na mesma frase, dá-me um frio na barriga por causa da possível leitura.
 
Estamos num momento-chave dessa transformação. Se o tema passa a ser considerado estratégico, com uma visão de ganhos a médio e longo prazo (muito importante a visão a médio e longo prazo) e sem necessidade de uma imposição de cima para baixo, aí o jogo pode efetivamente mudar de cara. Até hoje, só as empresas cujos dirigentes compartilhavam dessa visão puderam efetivamente programar estratégias vencedoras. A resistência é enorme na camada do meio, da gestão operacional, porque normalmente ela vem associada a mudança de cultura, alterações de processos e rotinas, mudança da sacrossanta cultura empresarial. É isso que mais custa: medo da mudança. O surreal é que esse medo está presente mesmo quando o tema é unanimemente aceito. Difícil entender, não é? Todos concordam que é importante criar mecanismos que coíbam a corrupção, que ouçam e protejam o consumidor, que desenvolvam as potencialidades do publico interno, etc, etc. Mas quando tentamos passar da teoria à prática, de ser coerente (link para o texto da coerência) parece que o mundo passa a andar a passos de caranguejo.
 
Como digo sempre, nunca ninguém disse que seria fácil. Para já é bom ver a evolução do tema, mesmo que a passos de tartaruga. Por mais que o assunto seja cobrado pela ONU aos governos, eu acredito que o grande fator de mudança ainda reside na mão das empresas. Toda a visão capitalista (o antigo capitalismo, o do lucro a qualquer preço) ainda serve de ancora para o modelo de sustentabilidade das empresas. Só com a mudança dessa visão os novos paradigmas da economia inclusiva poderão progressivamente ocupar espaço nas mentes dos empresários de amanhã. Mais uma vez, como quando falei sobre o espaço das mulheres no mundo empresarial, trata-se de física básica: para um novo corpo corpos ocupar mais espaço, o antigo corpo terá de ceder algum espaço. ;

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Conflito de gerações...

Na fila do supermercado, o caixa diz a uma senhora idosa:

- A senhora deveria trazer suas próprias sacolas para as compras, uma vez que sacos de plástico não são amigáveis ao meio ambiente.
A senhora pediu desculpas e disse:
- De fato, não havia essa onda verde no meu tempo.

O empregado respondeu:
- Esse é exatamente o nosso problema hoje em dia, minha senhora. Sua geração não se preocupou o suficiente com nosso meio ambiente.

- Você está certo - responde a velha senhora - nossa geração não se preocupou adequadamente com o meio ambiente. Naquela época, as garrafas de leite, garrafas de refrigerante e cerveja eram devolvidas à loja. A loja mandava de volta para a fábrica, onde eram lavadas e esterilizadas antes de cada reuso, e eles, os fabricantes de bebidas, usavam as garrafas, umas tantas outras vezes.

Realmente não nos preocupamos com o meio ambiente no nosso tempo. Subíamos as escadas, porque não havia escadas rolantes nas lojas e nos escritórios. Caminhávamos até o comércio, ao invés de usar o nosso carro de 300 cavalos de potência a cada vez que precisávamos ir a dois quarteirões de distância.

Mas você está certo. Nós não nos preocupávamos com o meio ambiente. Até então, as fraldas de bebês eram lavadas, porque não havia fraldas descartáveis. Roupas secas? a secagem era feita por nós mesmos, não nestas máquinas bamboleantes de 220 volts. A energia solar e eólica é que realmente secavam nossas roupas. Os meninos pequenos usavam as roupas que tinham sido de seus irmãos mais velhos, e não roupas sempre novas.

Mas é verdade: não havia preocupação com o meio ambiente, naqueles dias. Naquela época tínhamos somente uma TV ou rádio em casa, e não uma TV em cada quarto. E a TV tinha uma tela do tamanho de um lenço, não um telão do tamanho de um estádio; e que depois como será descartado?

Na cozinha, tínhamos que bater tudo com as mãos porque não havia máquinas elétricas, que fazem tudo por nós. Quando embalávamos algo um pouco frágil para o correio, usávamos jornal amassado para protegê-lo, não plástico bolha ou pellets de plástico que duram cinco séculos para começar a degradar. Naqueles tempos não se usava um motor a gasolina apenas para cortar a grama, era utilizado um cortador de grama que exigia músculos. O exercício era extraordinário, e não precisava ir a uma academia e usar esteiras que também funcionam a eletricidade.

Mas você tem razão: não havia naquela época preocupação com o meio ambiente. Bebíamos diretamente da fonte, quando estávamos com sede, em vez de usar copos plásticos e garrafas pet que agora lotam os oceanos. Canetas: recarregávamos com tinta umas tantas vezes ao invés de comprar uma outra. Abandonamos as navalhas, ao invés de jogar fora todos os aparelhos 'descartáveis' e poluentes só porque a lâmina ficou sem corte.

Na verdade, tivemos uma onda verde naquela época. Naqueles dias, as pessoas tomavam o bonde ou ônibus e os meninos iam em suas bicicletas ou a pé para a escola, ao invés de usar a mãe como um serviço de táxi 24 horas. Tínhamos só uma tomada em cada quarto, e não um quadro de tomadas em cada parede para alimentar uma dúzia de aparelhos. E nós não precisávamos de um GPS para receber sinais de satélites a milhas de distância no espaço, só para encontrar a pizzaria mais próxima.

Então, não é risível, senhor caixa, que a atual geração fale tanto em meio ambiente, mas não queira abrir mão de nada e não pense em viver um pouco como na minha época?

Aqui entre nós, eu li o texto todo com atenção e sorri tristemente. Sim triste por várias razões, mas essencialmente porque achei o texto, pedante, hipócrita e desnecessário.

Porquê pedante?

Porque claramente ele tenta mostrar o quanto aquela época era melhor que a atual, aquela geração mais consciente. Esse saudosismo sempre me incomodou porque ele é normalmente oriundo de uma visão estreita da realidade daquela época. Talvez quem escreveu também queira voltar ao tempo das ditaduras também? Ou ao tempo da primeira revolução industrial? É interessante como somos egocêntricos o suficiente para achar sempre que “no nosso tempo é que era bom”. Não deixa de ser engraçado pensar que provavelmente o escritor do texto deve ter pensado da geração anterior o mesmo que eu penso da dele ;)

Porque hipócrita?

Porque tudo aquilo que ele cita como sendo o supra-sumo do consumo consciente, era na época considerado um atraso de vida. Porque surgiram as fraldas e garrafas descartáveis? Porque as pessoas estavam cansadas de lavar as fraldas e de levar as garrafas de vidro de volta para a loja. Caminhavam até ao comércio? Os primeiros serviços de entrega surgiram nessa época. Só tinham uma TV em casa? Perguntei a todas as pessoas que me disseram isso porque só tinham uma e a maioria me respondeu que a TV era uma tecnologia nova e cara. Ou seja, se fosse barato como é hoje, provavelmente teriam uma em cada cômodo. Na cozinha batiam tudo à mão? Mesmo as pessoas que tinham máquinas? Tenho sérias dúvidas.

Eu poderia continuar a desmontar o raciocínio ponto por ponto, mas tudo converge para uma única conclusão: o consumismo “inconsciente” começou precisamente nessa geração fabulosa do pós-guerra. Se as coisas eram assim tão fantásticas, porque se inventaram meios de melhorar o conforto das famílias? Entendem onde quero chegar? Faz tudo parte de uma evolução. O erro foi de não pensar devidamente nas conseqüências. Mas ninguém com juízo vai negar a evolução que aconteceu nos últimos 50 anos.

Porque desnecessária?

Porque neste momento da nossa história é absolutamente ridículo tentar descobrir e castigar os culpados pela situação atual. Se todas as pessoas, de todas as gerações, parassem de apontar o dedo e gastassem mais energia tentando encontrar uma solução, provavelmente conseguiríamos juntos reverter o curso das coisas. Gastar mais tempo pensando em como fazer daqui em diante do que procurando por bodes expiatórios ou fantasmas do passado.

É só isso. Apenas uma opinião.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O trabalho remoto e a terceirização

Há uns dias atrás assisti a um encontro interessante que acontece em Brasília, a cada última segunda-feira do mês, num teatro do Brasília Shopping. É o Osso Buco: cinco ou seis apresentações sobre diversos assuntos, em sete minutos ou menos. Uma dessas apresentações foi sobre as vantagens do teletrabalho ou trabalho remoto.

Quando uns amigos e eu montamos uma empresa há uns anos atrás, usamos o teletrabalho como base de arranque, já que não havia faturamento para pagar uma estrutura de escritório. Embora para mim a experiência tenha sido péssima, eu entendo que seja uma solução muito viável para pessoas mais organizadas, focadas e disciplinadas.

Mas a abordagem que eu gostaria de dar ao tema é outra. O palestrante levantou todos os pontos positivos e negativos do trabalho remoto.

Alguns dos pontos positivos:
  • Independência e autonomia
  • Redução de custos de transporte, estacionamento e alimentação
  • Menos stress e pressão
  • Poder trabalhar sem interrupções ou controlar o seu ritmo
Alguns pontos negativos:
  • Nenhuma ou pouca socialização
  • Isolamento do mercado do trabalho e possível redução de oportunidades
  • Difícil separação entre trabalho e vida pessoal
  • Necessidade de MUITA disciplina para não se deixar enrolar pela liberdade de atuação
Eu digo que ele levantou quase todos. Eu perguntei para ele qual era o vínculo contratual entre o profissional e a empresa que o “contrata”. Coloco as aspas, pois na maioria das vezes não existe absolutamente nenhum contrato entre esses dois. Conceitualmente a idéia é boa, mas na realidade o que infelizmente acontece muito é que as empresas aproveitam para tratar o trabalhador como um empregado “normal” sem, no entanto, lhe atribuir os benefícios e regalias inerentes à posição. Ou seja, não existe vinculo empregatício, não pagam os impostos, seguridade social vai para o espaço, e como na maior parte dos casos os teletrabalhadores são contratados “por projeto”, podem ficar sem trabalho de um momento para o outro. Isso sem contar que muitas vezes a empresas levam muito mais tempo que o normal para pagar esses profissionais.

É uma pena. O que deveria ser uma solução inteligente para um mercado de trabalho cada vez mais descentralizado e globalizado acaba por se transformar em mais uma ferramenta ao serviço de uma forma insustentável de fazer negócios.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O Mundo, 10 anos depois do 11 de setembro...

Como o tempo passa! Enquanto a geração dos nossos pais viram em direto o homem pisar na lua, a nossa geração viu a insanidade humana atingir níveis surreais nunca antes atingidos, fazendo homens arquitetar o plano de usar aviões comerciais cheios de gente para perpetuar atentados terroristas. E a insanidade, como outras características típicas do ser humano, é equitativamente compartilhada no mundo.
 
Leiam (e vejam) aqui o relato do evento, como vivido pelo Eduardo Castro, um amigo jornalista que estava em Washington nesse dia. É de arrepiar. Eu, na altura em Lisboa, como muitos acompanhei tudo pela televisão...como se de um filme estranho se tratasse. E os tempos que vieram depois foram ainda mais estranhos...
 
É impossível hoje ter uma visão bipolar do mundo, de bem e mal, preto ou branco. Na década anterior ao onze de setembro o muro de Berlim caiu e ficamos preocupados com o desequilíbrio das forças USA/URSS. Parecendo que não esses dois impediam um ao outro de “carregar no botão”. Sem a URSS, o campo se abriu para a hegemonia estadunidense. Mentira. Na verdade só apareceram mais focos de tensão em países que se tinha tornado peões da guerra fria e que agora se viam órfãos dos patrocinadores. Sim, é uma visão propositalmente simplificada desse momento da história.

O que mudou desde o onze de setembro? Duas guerras no médio oriente encabeçadas pelo EUA, uma delas iniciada com base em mentiras e hoje sem perspectiva de fim, Saddam foi enforcado, atentados aconteceram em Madrid e em Londres, Bin Laden foi executado, Guantanamo foi encerrada (dizem), e o mundo se tornou um lugar mais seguro... supostamente. Digo supostamente porque existem vários tipos de segurança, não é? Enquanto o Bush filho liderava o mundo civilizado contra o eixo do mal, o mercado financeiro aproveitou todo o espaço deixado pela falta de mecanismos de controle (autorregulação do mercado, não é?), a especulação (bolsista e imobiliária) provocou crises catastróficas cujas consequências são hoje pagas pelo Obama (e o resto do mundo, claro). A guerra continua no médio oriente, o conflito entre Israel e Palestina está tão violento que até os EUA pedem a Israel para levantar o pé. Enfim, as coisas não mudaram tanto assim. Perdão, mudaram um pouco sim. Os EUA passaram da posição de país dos sonhos (land of milk and honey) para bullies do mundo!

No outro dia eu comentava precisamente com uma amiga o quanto o mundo admirava os Estados Unidos há umas décadas atrás e como isso mudou hoje. Não que eles tenham deixado de ser admirados e cobiçados. Mas sem dúvida que a magia se esvaneceu. É como quando nos damos conta que um ídolo nosso é, afinal, apenas humano. O mundo lhes pertenceu durante muito tempo. Cinema, música, entretenimento, tecnologia, esportes, economia...todos esses campos eram dominados por eles. Toda a minha base cultural foi construída com base no que lá se produzia. Talvez seja apenas uma impressão. Não sei se foi assim tão forte aqui no Brasil (apenas assumo que tenha sido forte pela teimosia de muit@s em me chamar “Deividi” invés de “David” ou mesmo “Davi”). Nos países onde eu passei a influencia era gigantesca. Em França o ministro da cultura nos anos 80 teve que passar uma lei obrigando as rádios a passar pelo menos 40% de musica francesa. Em Espanha foi um pouco diferente no campo da música produto nacional era muito forte. Mas nos outros domínios, era tudo norte-americano.

Obviamente que não imputo essa mudança de percepção ao 11 de setembro e suas consequências. Mas é verdade que temporalmente o “declínio do império americano” coincide um pouco com essa década. Talvez tenha começado nos anos 90 e se tenha cristalizado no novo milênio. Essa mudança de percepção é tão importante e grandiosa que uma maiores batalhas do governo de Obama foi/é resgatar as relações internacionais e reposicionar o país no seu lugar de líder do novo mundo. Tenho sérias dúvidas quanto a essa possibilidade. Na verdade, quem me lê aqui há algum tempo já deve ter percebido qual é a minha escolha de país para esse papel, não é? Não sei como nem quando, mas é um feeling...

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

A marcha das margaridas e o detestável egoísmo do ser humano

Na quinta-feira passada, 17 de agosto, aconteceu em Brasília a marcha das Margaridas. O objetivo da marcha é/foi simples: uma ação das mulheres do campo e da floresta para conquistar visibilidade, reconhecimento social e político e cidadania plena. Quem não conhece o movimento pode acessar o link acima ou ainda pesquisar mais sobre o assunto. Que fique apenas aqui registrado que eu apoio totalmente a marcha, assim como qualquer outra manifestação que reivindique direitos básicos de cidadania.

Durante o dia da marcha ouvi e li os comentários mais absurdos sobre ela. Fiquei absolutamente abismado pelo assustador grau de egoísmo que o ser humano é capaz de mostrar. A quantidade de pessoas ao meu redor que falaram em termos insultuosos dessas mulheres que apenas tentam tocar com o dedo o grau de conforto que a grande maioria dos habitantes de grandes metrópoles como Brasília têm, foi impressionante. Sim, claro que a cidade ficou um caos. Sim, claro que um montão de pessoas chegou atrasada ao trabalho. Sim, a cidade ficou suja de panfletos – não ouvi ninguém se queixar quando as campanhas políticas do final do ano passado deixaram a cidade tão suja que na minha rua nem era possível ver o alcatrão da estrada. Sim, claro que muitas pessoas não tiveram um dia produtivo. Sim, claro que a manifestação poderia ter acontecido num lugar onde não incomodasse ninguém ou incomodasse pouco. Sim, foram 70 mil pessoas incomodando quase dois milhões. Sim a tudo isso. Mas infelizmente não é assim que as coisas funcionam.

Vamos por partes.
  1. Não é preciso ser diplomado em física quântica para perceber que foi apenas um dia de incomodo, contra décadas de condições precárias. Hoje em Brasília já ninguém se queixa do transito, voltou tudo à normalidade para os citadinos. Já voltamos à rotina dos nossos empregos, academias, cinemas e restaurantes, clubes e esportes. As Margaridas também voltaram para a rotina da vida no campo e na floresta. As coisas mudaram pouco ou nada para incomodantes e incomodantes, mas não tenho nenhuma dúvida de quem dos dois está pior no filme.
  2. Provavelmente os brasilienses queriam que a marcha/manifestação acontecesse no SMN ou SMS (imaginário Setor de Manifestações Norte ou Sul). Já que em Brasília tudo é arquitetonicamente setorizado, podíamos sugerir a criação desses Setores, preferencialmente numa área afastada da cidade, onde as manifestações pudessem ser levadas sem problemas. Mas se uma manifestação não incomoda, não interrompe a aparente tranquilidade das coisas, ela não provoca discussão. Se ela não provoca discussão, ela não incentiva mudanças. E incentivar mudanças é o objetivo de qualquer manifestação, que a gente concorde ou não com as mudanças que elas sugerem. Lembro que foi com manifestações que incomodaram muito que negros e mulheres obtiveram direito de voto nas sociedades modernas. E por mais que eu não estivesse no Brasil durante o “diretas já”, lembro-me das imagens da região da Sé em São Paulo completamente bloqueada pelo povo. Aposto que muitas pessoas também foram incomodadas nesse dias...
  3. A marcha foi amplamente e antecipadamente divulgada durante as semanas e dias que antecederam. Todas as rádios avisavam do itinerário da manifestação e aconselhavam itinerários alternativos para os transeuntes. Dizer que foram 2 milhões de pessoas incomodadas é obviamente mais uma declaração profundamente falsa. Quem foi mais incomodado foi quem não prestou atenção ou achou que não iria haver tanta gente. No primeiro caso sinto pena, no segundo penso “bem feito”.
Incomoda-me muito o egoísmo. É algo pessoal. É um sentimento profundamente humano, eu sei. Vem de um instinto de preservação. E incluo-me obviamente nessa visão. Provavelmente não teria abordado este tema de forma tão contundente se a declaração de uma amiga sobre as margaridas não tivesse servido de gatilho para a discussão. O egoísmo é para mim simplesmente sintoma da incapacidade do ser humano se colocar no lugar do outro, sequer por instantes, para tentar entender as razões da atuação do outro, essa coisa profundamente humana chamada empatia. Parece que é um sentimento profundamente e voluntariamente enclausurado.
Ouço diariamente pessoas usarem a palavra Amor com toda a leviandade do mundo. Amam profissões, animais, times ou esportes, até comida ou roupas, mas são incapazes de sentir empatia por um ser humano, uma pessoa que almeja melhores condições de vida. Reconheço que existem casos em que isso é muito difícil de fazer. Penso no nacionalista norueguês que matou 90 pessoas do seu país, por exemplo. Ou de pais que matam os filhos. Mas este caso não é um deles. Haja bom senso...
Como dizia a Rita Lee, os incomodados que se incomodem!

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Abandono de bebês...

No outro dia fui ao hospital por causa de uma dor de garganta que não passava há um mês. Enquanto esperava pelo meu atendimento, distraidamente eu olhava para a televisão. Era final da tarde e passava uma emissão num canal público que eu não conhecia. O tema tratado nesse dia parecia ser “bebês abandonados” ou algo assim, porque durante as duas horas que esperei o apresentador não falou de outra coisa. Usando como fio condutor o caso de uma senhora que tinha encontrado um bebê numa lixeira, a emissão levantou vários casos similares, dos mais escabrosos aos mais felizes. Mostraram imagens de arquivo de pessoas que encontraram bebês mortos em sacolas de lixo, imagens de câmeras de segurança onde tentam identificar as pessoas que abandonam, havia até gente que filmou enquanto encontrava a(s) criança(s), como se antecipadamente soubesse que esse seria o seu passaporte para a fama. Tudo isto ia sendo metronomicamente interrompido por pedaços de entrevista da senhora que tinha acabado de salvar a criança, onde esta apenas manifestava que ela não era nenhuma heroína, que apena se tinha limitado a fazer o que o bom senso ditava.

O público que esperava pela sua vez no átrio do hospital, como eu, acompanhava tudo com uma atenção meticulosa alimentada pelo voyeurismo natural que temos em nós, pontuando aqui e ali o silencio do hospital por manifestações hora de nojo ou rejeição, hora de aceitação e conivência, dependendo do que a TV mostrava no momento. Num momento em que o programa apresentava imagens de uma câmera de segurança, que mostrava uma mulher abandonando um bebê na guarita de um predio residencial de Brasília, um dos presentes na sala exclamou algo como “deveria ser fuzilada ou mandada para sempre para Carandiru...“.

Eu confesso que, no meio de tantas demonstrações de desprezo, a única coisa que eu consegui pensar dessas mulheres e homens (sim, homens, e não eram poucos) que abandonavam os bebês em rios, florestas, lixeiras no meio da cidade, entradas de shopping etc. é “coitados”. Pois. Coitados. Porque eu parto do pressuposto que ninguém abandona um bebê sem sofrimento. Assumir que todas as pessoas que abandonam bebês ou crianças são psicóticos desprovidos de sentimentos parece-me sem sentido, alem de ser confortavelmente arrogante. Ou arrogantemente confortável, como quiserem. Sim, a lei das probabilidades diz que certamente entre esse grupo existem pessoas absolutamente sem escrúpulos ou consciência. Mas daí a assumir que são todas ou mesmo que é a maioria, vai um mundo. Se assim fosse, essas pessoas matariam as crianças. Mas não o fazem, correto?

Eu tenho precisamente a sensação que a maioria chega à decisão do abandono quando já esgotou todas as outras opções, quando já pensou em quase todas as outras possibilidades. Na verdade não pensou em todas. Só que ao crescer, ao nos tornarmos “adultos” parece que perdemos a sapiência de pedir ajuda. Pedir ajuda é um sinal de fraqueza, sobretudo nas sociedades modernas. Então só resta o abandono, só resta largar a criança num lugar qualquer e esperar uma de duas coisas: que alguém encontre antes que seja tarde demais ou que a criança morra depressa e sem sofrimento, como se alguma dessas duas situações fosse aliviar o peso da decisão.

Não tenho resposta para esse tipo de situação. Não sou psicólogo nem sei que tipo de ajuda poderia ser dada. Mas tenho o sentimento que a repressão é de longe a pior resposta possível. Essas pessoas precisam de ajuda. Consideramos drogados como doentes e pessoas que abandonam crianças não? Onde está a linha que separa um tipo do outro? Quem é o juiz dessa sentença?

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Queixem-se, reclamem! Esbravejem, por favor!

Eu sei que é um tema recorrente nos meus textos, mas é apenas a manifestação de uma intuição, da sensação que muita mudança pode vir por este caminho. E que caminho é esse? O do poder do cidadão, do consumidor, da pessoa, do CPF.

Quantas vezes ouvimos familiares ou amigos se queixarem de alguma situação na qual eles se sentiram lesados de alguma forma? Aliás, nem precisa vir de fora. Tenho a certeza que cada um de nós já passou por situações dessas.

Uma pequena história para contextualizar o meu raciocínio. Quem já conhece este blog sabe que há uns tempos atrás eu recebi um email da TAM avisando que a partir de certa data as viagens com milhas dentro da América Latina passariam a custar quinze mil milhas invés de dez mil. Eu fiquei indignado porque como cliente, eu simplesmente não tinha sido consultado, nem direta nem indiretamente através de algum grupo focal ou similar. Queixei-me em todos os canais à minha disposição (twitter, facebook...) e até escrevi sobre isso. Usei o Reclame Aqui que já me tinha sido útil em outros casos, divulguei em todas as redes sociais. O que achei mais estranho é que muitos dos meus amigos ou colegas de trabalho também tinham recebido a mesma comunicação e ninguém tinha achado estranho. Todos tinham achado escandalosa a decisão unilateral da TAM, mas ninguém tinha reclamado. Uns até me diziam que não iria servir para nada. O que aconteceu foi que eu recebi uma resposta do “fale com o presidente da TAM” e iniciei um diálogo com eles, tentando explicar como a decisão deles ia contra os interesses dos seus melhores e mais fiéis clientes, ou como, nó mínimo deveriam deixar esses clientes usar as milhas ganhas antes da mudança com as regras de resgate anteriores (dez mil milhas por trecho). Não serviu de nada. A resposta foi um elegante e burocrático “lamento mas é assim”. E eu pensei comigo mesmo: ok, então eu vou usar as milhas que tenho e vou para a concorrência. Simples assim. Eu até tinha um cartão de crédito da companhia deles, imaginem. Não tenho a veemência de achar que vou fazer um estrago insuperável à TAM, claro. Mas mesmo assim, eles perderam um bom cliente e sobretudo, arranjara uma pessoa que irá falar mal deles sempre que possível. Uma pena.

O fundamental desta historia não é que eu não consegui o que queria. O que me parece importante aqui é que demasiadas vezes nos deixamos embrulhar nessa falácia de que não vale a pena se queixar ou fazer barulho. É algo tão simples e claro desde o primórdio dos tempos: um sozinho talvez não faça muita diferença. Mas muitas pessoas? Existem hoje uma série de meios para vociferar a nossa indignação quando nos sentimos genuinamente lesados. Eu não me abstenho delas, uso sempre que posso. Também uso para falar bem, é importante que sejamos justos também. Se podemos beliscar a reputação de uma empresa, de uma entidade, de um governo que seja, por conta de alguma atitude contra o cidadão/consumidor, é importante também que sejamos capazes de parabenizar essas mesmas entidades pelo bem que fazem. A minha opinião é simples: se não usamos as ferramentas e meios à nossa disposição para corrigir o que achamos estar errado, então não temos direito a queixa. Simples assim. Isso funciona do ponto vista da sociedade de consumo e funciona também do ponto de vista de uma democracia saudável.

Por isso, sempre que possível: queixem-se, reclamem, esbravejem, por favor!

terça-feira, 26 de julho de 2011

O papel da mídia...

Só agora me dei conta que ainda não tinha ajustado com a mídia aqui no Blog. No outro dia eu li um texto no blog da Fernanda, que transmitia a sua repulsa pela postura da mídia nos dias seguintes aos assassinatos que aconteceram na escola no Rio de Janeiro. E como eu a entendo. Sob o manto da rejeição ela questionava um pouco o papel da mídia no cenário atual. O link acima exemplifica bem o que eu quero dizer, com o narrador que apresenta o facto como se de um jogo de futebol se tratasse.
 
Falamos muito disso, não é? De como a mídia se tornou sensacionalista, vendendo historias repletas de sexo, sangue, mortos, corrupção, desastres naturais etc. Essa é uma tendência que, segundo uma pesquisa rápida e superficial, começou no fim do século XIX com Pulitzer e Hearst (Sim, esses mesmos. Um deu nome a um prêmio conceituado de comunicação e outro foi inspiração total para o clássico Citizen Kane de Orson Welles). A partir desse momento a mídia virou uma corrida para atingir grande circulação (vendas) e passamos a ter o direito de saber tudo que de pior acontece pelo mundo. Não quer dizer que as boas noticias não são relatadas. Elas são, mas representam uma pequena parcela do espaço total.

Já experimentaram analisar um jornal televisivo? Façam essa experiência. Pouco importa o canal, o resultado será quase sempre o mesmo: três quartos de notícias “negativas” e o resto de coisas mais leves. O jornais em papel seguem a mesma tendência e é normal, pois pertencem todos aos mesmos grupos de mídia. Não podemos dizer que não são coerentes. Isso é um retrato da realidade? No mundo em que vivemos acontecem mais coisas negativas do que positivas? Eu penso que não. No entanto não tenho duvida que o “negativo” vende mais. O que é uma pena porque e acredito que o “positivo” é incomparavelmente mais viral.

E qual a razão dessa virada? O que provocou essa transformação da mídia informadora e educadora (sim, teve esse objetivo sim), relatora isenta dos eventos, em uma máquina que apela pelos sentimentos mais básicos do ser humano para vender cada vez mais? Precisamente isso: a “descoberta” desse voyeurismo macabro que todo ser humano tem, com níveis distintos de atividade ou rejeição. O que é que vende? Ver outros seres humanos fazer coisas que nós, em algum lugar da nossa psique gostaríamos de fazer, mas não temos coragem para. O Big Brother não tem nenhum outro segredo. É só e unicamente um condensado desse lixo. Sim, sou muito intolerante com as pessoas que vêm esse tipo de programa. Lembro-me de um dia em Lisboa que, na empresa onde eu trabalhava, todos se levantaram ao mesmo tempo para ir ver na TV uma redifusão de uma cena que tinha acontecido no Big Brother durante a madrugada anterior. E a cena era simplesmente um homem dando um pontapé na barriga de uma mulher. Isso mesmo. E todos correram para ver, do senhor da limpeza à diretora de recurso humanos, diplomados, pós-graduados, doutorados...fiquei abismado. E o pior é que ninguém entendia a minha cara de gato espantado. E eu me perguntei – e ainda me pergunto – se a mídia não poderia decidir conscientemente fugir desse padrão e estimular o que de melhor têm os seus leitores/espectadores. Sim, sou inocente...

Como a maioria das pessoas de classe média, tenho uma TV em casa, tenho TV a cabo, Internet banda larga etc. Mas não me recordo de quando foi o ultimo jornal televisivo que vi. Jornais em papel então, acho que só leio quando vou à casa da minha mãe que assina um. E leio quase sempre só a pagina onde estão publicados os horários dos filmes. Vivo alheio do mundo? Não. Quando quero informação – e unicamente a informação que quero – acesso a Internet. Esse canal tem essa vantagem: eu posso saber o resultado de Wimbledon sem ter que ouvir que um homem matou a família à pancada em algum subúrbio do mundo. Posso saber como anda o projeto-lei que despenaliza o aborto ou legaliza a união entre pessoas do mesmo sexo, sem ter de aturar as noticias sobre os devaneios sexuais do ex-presidente/diretor do FMI. Posso escolher ver só coisas que considero positivas – sim, uma avaliação profundamente pessoal – sem me deixar alienar pelos detalhes sórdidos das noticias que considero negativas. Não ignoro. Simplesmente tento filtrar, destilar, consumir de uma forma que me deixa algo confiante com o destino da humanidade. Mas seria muito mais fácil se a mídia colaborasse voluntariamente. Eles têm acesso a milhões de pessoas ao mesmo tempo. Deveriam ser mais responsáveis. Muito mais. Mas como digo quase sempre, a bola não está unicamente no campo “deles”. Nós podemos sempre decidir “desligar” e ir ver lá fora como o Sol brilha.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Sobre a animação "Rio"


Um dos consultores do Instituto Ethos nos explicou um dia, que quando entramos nesta “onda” da RSE e Sustentabilidade é terrível. Porque tudo é Sustentabilidade. Isso basicamente quer dizer que o profissional da área nunca para de trabalhar. Mesmo durante o meu lazer o olhar crítico não para. Em alguns momentos até parecemos “velhos e ranzinzas”, independentemente da idade real que temos. O olhar é assustadoramente critico. Mas não é uma critica destrutiva, daquelas que só vêm o mal em todo o lado? Antes pelo contrário, é um olhar construtiva, sempre com objetivos de melhorar.




Há meses atrás, como milhares de pais, fui ver a animação Rio com o meu filho. A expectativa era grande pois todo sabíamos que íamos ver uma realidade próxima. Ainda mais com os olhos do mundo virados para o Brasil e para o Rio – sim, preconceituosamente lá fora ainda acham que o Brasil é o Rio – ás vésperas da Copa e dos Jogos Olímpicos. Percebo que o filme também era uma oportunidade de “venda” do Brasil como destino turístico. Aliás, em pouco tempo dois filmes diferentes fizeram esse papel de guia turístico: Rio e Velozes e Furiosos, operação Rio.

Do ponto de vista técnico a animação arrebentou. Nunca as cores foram assim tão vibrantes, exóticas, os sons mais cristalinos. Quase que uma experiência sinestésica. Mas tudo o resto falhou. Até a tentativa de “vender” o Rio como destino turístico falhou, na minha opinião. O que eu vi foi uma série de preconceitos materializados a cores e em alta definição:
  • A dentista – médica formada e diplomada – meio nua dançando no calçadão
  • Os bandidos são todos negros e idiotas
  • O guarda é um gay reprimido
  • Os macaquinhos são ladrões
  • Os estrangeiros são inteligentes e roubados
  • Etc...
Estes são apenas alguns dos clichês que eu me lembro depois desse tempo todo. E não é o pior. O pior é tudo isso ter sido assinado por um diretor brasileiro – Carlos Saldanha. Se tivesse sido assinado por um diretor estrangeiro até que eu poderia colocar por conta da ignorância que sempre existiu. O outro filme dos carros que nem merece ser aqui explicado fez precisamente isso. Pintou a cidade com cores de fazem acreditar que a maioria dos habitantes do Rio são bandido. Sabem? Aquela técnica de filmagem que ajuda os menos inteligentes entre nós a distinguir os bonzinhos dos mauzinhos pela cor e definição de cada um? Isso mesmo.

Mas numa animação assinada por um brasileiro é como se ele estivesse a dizer para o resto do mundo “é assim mesmo. aquela visão que vocês têm do Rio (e consequentemente do Brasil) é verdadeira!”. E isso me custou um pouco. Tudo bem que até tem a redenção da criança que tenta amenizar um pouco o tecido de preconceitos – aliás isso dever ter dado idéias a quem ainda acha possível vir ao Brasil pegar crianças para adoção. Mas mesmo assim, confesso que saí do filme um pouco triste. O meu filho gostou mas aqui e ali ainda surgiram perguntas singelas do tipo “pai, todos os papagaios são roubados no Rio?”.

Pois é...

terça-feira, 21 de junho de 2011

Sobre o Programa Pro-equidade de Gênero e Raça

Acabamos de efetuar a inscrição no Programa de Equidade de Gênero e Raça da Secretaria de Políticas para as Mulheres. Agora temos mais ou menos três meses para estruturar o planejamento e um cronograma de ações para apresentar durante um ano, para no fim poder obter o selo de Pro equidade. Simplificando um pouco o processo, para a obtenção do selo o plano de ação tem de ser avaliado e validado pela secretaria e depois temos de cumprir pelo menos 70% das ações planejadas. Posteriormente, para manutenção do selo, teremos de continuar com planos de ação anuais. O objetivo do selo é estimular nas empresas a implantação de mudanças estruturais que contribuam para reduzir o fosso entre mulheres e homens.

Quase sempre que eu menciono esse fosso, me respondem que as empresas não são sexistas, que elas apenas seguem a lógica de mercado de recrutar o melhor profissional para o cargo, independentemente do seu sexo, raça ou orientação sexual. Até as mulheres protegem usam esse discurso, sob o pretexto de não quererem ser favorecidas. Gente, é obvio que qualquer profissional, tendo a escolha num mercado justo e imparcial, preferiria ser escolhido pelas suas capacidades e não pela cor da pele ou por ser primo do dono. Bom, quase todos ;) Se seguirmos o raciocínio da lógica de mercado acima citado, e avaliamos estatisticamente o mercado do trabalho então podemos chegar à conclusão que o “melhor profissional para o cargo” é homem, branco e heterossexual. E eu não teria absolutamente nenhum problema com essa conclusão...se ela não fosse falsa. Com diz um amigo “eu até posso concordar contigo, mas aí estaríamos os dois errados!”. O mercado continua parcial desde os primórdios dos tempos quando nem pretos nem mulheres podia trabalhar – pouco importa as razões, pois hoje concordamos que elas estavam erradas. Isso quer dizer que é preciso um empurrão para corrigir. É um dos objetivos do selo. Eu entendo que atualmente o universo empresarial é ultra masculinizado, e as empresas têm essencialmente medo de se tornarem menos competitivas por dar acesso às mulheres a cargos gerenciais. Para mim esse ponto de vista, alem de ser altamente preconceituoso, demonstra sobretudo uma gritante falta de visão de negócio. Olhando para o mercado de forma assumidamente simplistica e pragmática, eu vejo que a maioria dos consumidores são mulheres. Não só são maioria como, mesmo quando não são o provedor da família, são elas que tomam a decisão de consumo. Quem melhor do que outras mulheres para abordar esse mercado?

Voltando ao programa, este ano foi adicionada a questão da raça. Eu confesso que ainda não sei se é boa idéia. A minha dúvida é genuína mesmo. Tendo a pensar que quando queremos resolver vários problemas ao mesmo tempo acabamos por não resolver nenhum. Ao mesmo tempo sei da urgência de tocar esses dois assuntos com a mesma veemência. Espero que essa junção venha agregar valor e não dispersar esforços. Como dizem “cachorro que tem dois donos morre de fome ou come duas vezes. Espero que seja a segunda opção.

Então agora é um caminho sem retorno? Sim. Creio que sim. É péssimo para qualquer empresa “sair” do selo. Isso demonstrará que o assunto deixou de ser tratado e priorizado internamente, creio. Ou então que seja pela boa noticia: a empresa já não precisa do selo porque atingiu todos os níveis de excelência na gestão do problema. Aís sim, é uma boa razão para se transformar num case, ensinar outras empresas a fazer o mesmo, e sobretudo comprovar com resultados que a equidade de gênero e raça trouxe mais valias que nunca antes tinha sido previstas ou exploradas ;) Abraços!

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Para “implantar” a RSE é preciso muito foco!

É muito fácil confundir uma gerência de responsabilidade social ou de sustentabilidade com o “sindicato” ou o ombudsman de uma empresa. Para uma empresa que nunca tocou formalmente no assunto, a criação de uma área dedicada tende a abrir a torneira de uma série de queixas e reivindicações que, como não existia nenhum canal para veiculá-las, até então ficavam represadas. As propostas de criação de comissões de empregados para negociar salários, as queixas sobre assédio moral e/ou sexual, as discussões sobre condições de trabalho e saúde, os pedidos por uma gestão mais participativa, a cobrança por mais integração e interação entre as diversas áreas de uma empresa ou entre empresas de um mesmo grupo, etc. Tudo surge de repente e é encaminhado para essa nova área executiva. Não me oponho a esse encaminhamento, mas normalmente cobro por um mínimo de bom senso, coerência e, sobretudo foco no tratamento desses assuntos.

Primeiro, no meu ponto de vista uma área de RSE e Sustentabilidade tem um função muito mais estrutural e voltada para o futuro, do que de ser o bombeiro ou band-aid das situações do passado e/ou presente. Isso não quer dizer que os problemas identificados não merecem a nossa atenção. O que eu quero dizer é que a área de RSE tem de focar muito mais na criação soluções que impeçam o problema de surgir outra vez, do que na solução do problema. E isso é difícil, pois em alguns momentos temos de, conscientemente, fazer de surdos a pedidos de ajuda que dificilmente podemos recusar. Como eu costumo dizer para a minha equipe, os nossos objetivos são a longo prazo e não podemos nos distrair. Para atingi-los precisamos de muita disciplina, consistência e foco. O resultado da nossa atuação – se for boa – só será visível daqui a uns três ou quatro anos.

A outra necessidade é bom-senso e coerência. Muitos dos “problemas” que chegam às áreas de RSE não são específicos à área. Como o tema é abrangente – tudo é RSE – então acabamos por não fazer o esforço de separar o joio do trigo. Problemas relacionados com comunicação interna devem ser resolvidos pela área de comunicação. Problemas relacionados com gestão de pessoas devem ser encaminhados pelo RH. Queixas de clientes devem ser tratadas pela área de negócios que gere o produto que originou a queixa. E assim de seguida. Parece simples, não é? Sem essa clara divisão de papeis a gestão dos temas se torna confusa, os resultados difíceis de mensurar e os láureos difíceis de atribuir. Quem faz ou fez o que?

E isso me leva a um ultimo ponto. A área de RSE – como as demais áreas de uma empresa ou grupo empresarial – deve ter objetivos, metas e períodos para implantação claramente identificados e estabelecidos. E da mesma forma, a RSE deve ser remunerada/premiada em consequência. Sem isso é difícil ter foco.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Sociadede civil na gestão das ciadades?

Uma vez não é costume, vou escrever sobre um tema local, particular à cidade onde moro: Brasília!

Há umas semanas atrás eu fui convidado ao lançamento do movimento Brasiliense de Coração. Trata-se de uma organização da sociedade civil que tem por objetivo resgatar a auto-estima do brasiliense – seja ele de nascimento ou de adoção – pela cidade onde vive. Eu faço parte do segundo grupo – sou brasiliense adotivo – e embora só tenha chegado aqui em 2006, a minha relação com a cidade já vem de antes, graças sua à fama arquitetônica e política. No entanto, como eu falei no texto sobre o aniversário de 50 anos de Brasília, os últimos anos forma annus horribilis para quem vive aqui. Por ser o centro político do país a cidade já carrega por assimilação a carga negativa normalmente atribuída a esse universo. O escândalo da caixa de pandora do governo anterior veio dar uma martelada final no ego já machucado do brasiliense. Qualquer um de nós sabe o que é viajar para o resto do Brasil e ouvir piadas duvidosas sobre nós mesmo e a nossa cidade. Todo mundo lembra-se facilmente de associar a Brasília a corrupção, ladroagem, estelionato, desvios de fundos e outros atributos do mesmo campo semântico; mas poucos se lembram que esse pessoal “do mal” foi votado pelo país inteiro e que o Brasiliense pouco tem a ver com isso.

Assim surge o Brasiliense de Coração. Durante a cerimônia de lançamento eu não pude deixar de pensar na rede Nossa São Paulo ou ainda o movimento Nossa BH. O ponto comum dessas organizações é serem coordenadas por civis preocupados com o pouco poder ou participação que têm na gestão dessas cidades. Acho tudo isso muito honrável. Quantas vezes ouvi dizer “o governo deveria fazer isto, o governo deveria fazer aquilo” quando falávamos das coisas que corriam mal na gestão de uma cidade ou país? Pois é bom ver cidadãos conscientes se organizarem para tomar em mãos o que for possível tomar em mãos. É importante salientar que não se trata de se substituir ao poder publico. Muito pelo contrário. Trata-se de congregar esforços para que todas as partes interessadas possam trabalhar juntas pelo bem da cidade. Tenho a certeza que cada uma dessas organizações tem a premissa de se disponibilizar para contribuir com o poder local nas operações que impactam diretamente na melhoria do bem-estar dos cidadãos. Vou acompanhar de perto e aconselho a todos a verificar a existência de algo similar nsa suas cidades.

No caso de Brasília, durante a apresentação uma pessoa fez a única pergunta que eu queria fazer: como vai ser o envolvimento das cidades do entorno? Há uns dias saiu uma estatística aterradora que dizia que as cidades do Novo Gama e Luziânia têm os pires índices de criminalidade da América latina! Pois é. Brasília não é só o plano piloto. Vai ser um desafio gigantesco integrar essas cidades nos planos do Brasiliense de coração...

quarta-feira, 25 de maio de 2011

O Estado, os direitos das minorias e a ditadura do politicamente correto

Este tema me foi sugerido por um e participante do blog.

Esta sugestão me chegou, coincidentemente ou não, ao mesmo tempo em que os estado brasileiro está no processo de reconhecer direitos aos casais homossexuais. E, como não podia deixar de ser, surgem os dúvidas sobre o papel do estado na regulamentação dos relacionamentos entre as pessoas, questionando se cabe a ele esse papel paternalista numa sociedade que supostamente já não é criança há muito tempo.

Ao mesmo tempo fizeram-me outra pergunta: se o politicamente correto é razão suficiente para silenciar a voz da oposição. Hoje, dizer que as relações homoafetivas – uma nova palavra politicamente correta para homossexual – devem ser protegidas pelas mesmas leis e direitos que protegem as relações heteroafetivas (já agora, sejamos coerentes...) é considerado uma posição politicamente.

Como dizia Jack, vamos por partes!

E começando pelo fim, a questão do politicamente correto é um tema interessante, pois toca num assunto que muito me fascina que são os movimentos de massa. Um assunto que era tabu até uma década atrás, hoje é politicamente correto. Ou vice versa. Os fenômenos de moda são mutáveis e extremamente permeáveis na psique popular. E quem está no poder tende quase sempre a querer dobrar as regras do jogo em seu favor, aproveitando-se da maleabilidade politicamente correta das massas, não é? Mas é bom ver que a voz da oposição, dos que discordam da maioria é fundamental para a riqueza do debate. Se não há oposição à maioria ou ao politicamente correto então encontramo-nos perante uma ditadura, não é?

E no caso do reconhecimento de direitos acima citados, não creio que garantir direitos aos homossexuais seja uma posição assim tão politicamente correta. Está na moda, é um fato. E ainda bem, por que é um tema importante, como tantos outros que envolvem o respeito pelas minorias. Mas é apenas uma posição de justiça e igualdade. Aliás, numa sociedade como a brasileira (e em geral nas democracias ocidentais), onde a maioria tem uma prática religiosa muito forte, o tema é profundamente controverso. Os homossexuais são pessoas como quaisquer outras. Não existe absolutamente nenhum atributo que me diferencie de um homossexual. O julgamento se a orientação sexual é correta ou não – saliento e insisto que orientação sexual é muito diferente de escolha sexual – e do domínio pessoal. E o mais interessante é que é essa mesma garantia de direitos que também protege a liberdade para esse julgamento. Relativamente simples, não é?

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Ouvindo o cliente!

Este post é atípico. Eu sou cliente fidelidade da TAM e na semana passada recebi um email informando que, a partir de 1º de julho, a quantidade de milhas necessárias para resgatar passagens na América Latina aumentaria 50%. Assim. Sem anestesia, sem carinho nem beijo na orelha...

Comecei por pensar em esquecer o assunto, mas depois mudei de ideia. Coloquei uma reclamação online no Reclame Aqui e mandei um email para o presidente da companhia. Abaixo segue o nosso dialogo até agora.

Meu email para o presidente:
Como muitos brasileiros, sou cliente do programa de fidelidade da TAM. Provavelmente como eles todos, acabei de ser informado por email que a quantidade de milhas necessárias para resgatar passagens para a America Latina simplesmente aumentará 50% a partir do dia 1 de julho de 2011. Simples assim. Um email para um aumento de 50%. De certeza que esse aumento estará protegido por alguma clausula escrita em letras minúsculas nas regras do programa. No entanto não deixo de me sentir profundamente desrespeitado como consumidor fiel à marca. Se não existe nenhuma lei que impeça este tipo de aumento arbitrário - note-se que obviamente que a quantidade de milha que o cliente ganhará nos mesmos trechos não mudará - deveria existir. Provavelmente deixarei progressivamente de usar a TAM em benefício de outras companhias e farei a devida publicidade em todas as redes sociais que frequento. Cordialmente,

Resposta do presidente (em 2 dias):
Prezado Sr. David,

Tomei conhecimento da sua mensagem enviada ao site Reclame Aqui para manifestar suas impressões a respeito da alteração da regra para resgate de pontos do Programa Fidelidade para voos internacionais na América do Sul.

Gostaria de explicar que esse tema foi cuidadosamente estudado para que chegássemos a uma proposta razoável. É importante lembrar que o nosso Programa Fidelidade é o único que não limita ou restringe assentos no Brasil e na America do Sul, ou seja, havendo lugares no voo, a reserva para emissão com pontos é sempre confirmada. Ocorre que o Programa foi criado em 1993 e a dinâmica da demanda requer alguns ajustes. Foi isso o que fizemos.

Mantivemos o diferencial de não restrição, e alteramos de 20.000 para 30.000 o número de pontos necessários para uma viagem de ida e volta para a América do Sul. As viagens internacionais têm custos mais altos que as domésticas, portanto estamos adequando a regra do programa à realidade.

Os critérios para emissões dentro do Brasil não tiveram alteração (20.000 pontos para ida e volta).

Espero ter esclarecido essa questão e fico à disposição para o que precisar.

Atenciosamente,

Líbano Barroso

Presidente

Minha contra resposta:
Bom dia prezado Presidente!

Antes de mais agradeço a sua resposta e sobretudo a rapidez com que ela me chegou. A sua equipe está de parabéns por isso.

No entanto mantenho o meu descontentamento quanto à alteração arbitraria das regras. Tentarei organizar o raciocínio em 7 pontos:
  1. Contrariamente ao que poderia deixar entender a sua resposta, em momento nenhum eu, cliente, fui consultado. Nem diretamente, nem através de alguma representação dos seus clientes.
  2. Por mais que me possa dizer que o programa fidelidade é um apenas um “beneficio colateral” pela minha lealdade como cliente à sua companhia, que outras companhias não oferecem algo com a mesma qualidade (comparação indireta feita na sua resposta abaixo), que a TAM avaliou cuidadosamente o tema antes de proceder à modificação, a realidade é que a sua companhia, sob a sua direção, aumentou 50% de uma vez o valor de um dos seus produtos. Se não existe lei que proíba isso, deveria existir ;)
  3. Pior do que isso, fê-lo para parte do seu segmento de clientes fieis, aqueles que usam a sua companhia com regularidade. Na minha humilde opinião, não faz o mínimo sentido. Mas posso estar enganado por desconhecimento das particularidades do vosso negócio.
  4. E obviamente que a quantidade de milhas que a quantidade de milhas que esses clientes ganharão nesses mesmos voos não aumentará, não é?
  5. Os prejudicados, como quase sempre acontece quando existe um aumento de preço, são os seus clientes “classe média”. Aqueles que não viajam suficiente para poder resgatar viagens internacionais (que provavelmente podem pagar facilmente), nem viajam pouco demais para poder usar as milhas.
  6. Outro ponto, eu assinei o cartão TAM Itaucard para poder continuar a beneficiar dos seus serviços. E até hoje aconselhava a todos que me queriam ouvir para fazer o mesmo e usar a sua companhia. Isso é o que o seu programa conseguiu de mim: lealdade. Isso tem um preço que está (ou deveria estar) embutido no preço do seu produto vendido para o grande publico, aqueles que não lhe são fieis.
  7. Lembro ainda que hoje a TAM já é percebida como uma companhia mais cara do que a concorrência, o que não era o caso há uns anos atrás.
Enfim, tenho algum ceticismo quanto ao efeito que esta mensagem poderá ter na sua decisão, mas no entanto tento não deixar de fazer a minha parte. Fico com muita pena que essa decisão tenha sido tomada, gostaria que mais usuários fieis se queixassem pois talvez só assim a sua companhia considere ser mais coerente com os seus clientes fieis.
 
Cordialmente,

David Borges
 
Vamos ver o que ele responde... se responder...

domingo, 8 de maio de 2011

Alimentos SA

Nada de muito novo embaixo do sol, apenas mais um olhar no lado negro da industria da comida. Quem viu o Fast Food Nation? Well... check this out! Zappa dizia You are what you is. Hoje provavelmente diria you are what you eat.

Aqui só encontrei 8 dos 10 episodios legendados. Mas se procurarem, os outros também estão no tubo.

Bon appétit!







quarta-feira, 4 de maio de 2011

O mundo em que vivemos...

É impossível viver alienado do que acontece ao nosso redor. Há uns dias atrás eu quase escrevi sobre a o casamento lá do príncipe e da plebeia. Na realidade eu até queria evitar o assunto pelo tema me parecer tão inócuo. Só que o ruído mediático foi crescente até chegar ao dia do casamento que ficou difícil não comentar o assunto. Mas “felizmente” a morte do terrorista mais procurado do mundo me poupou o esforço de escrever, em pleno século 21, sobre reis e rainhas, plebeias e princesos, num mundo onde uma criança morre de fome a cada cinco segundos.

E saímos de uma loucura para entrar em outra. De repente o mundo ocidental e civilizado encheu-se de orgulho enquanto festejava o assassinato com um tiro na cabeça – coisa de videogame – de um homem que hoje se sabe que estava desarmado, invés de levá-lo a julgamento pelos crimes que orquestrou. Sim, o mundo inteiro quase sem exceção se congratula pela grande vitória sobre o terrorismo, encabeçada pela hegemonia moralizadora e cheia de valores universais da democracia norte-americana. Os mesmo senhores da moral que quase crucificaram a Janet Jackson por ter mostrado o seio/mamilo durante uma performance artística, hoje aplaudem de pé a morte de um homem.

Aqui e ali, nas redes sociais, surgiram umas poucas mensagens de bom senso, que depressa foram ou serão descritas como burrice, pacifismo ignorante, inocência inconsequente, comunismo exacerbado, esquerda patética, etc, etc. Surgiu até uma citação que, embora erroneamente atribuída ao reverendo Martin Luther King, concretizava a ideia que a violência gera violência, o ódio gera ódio.

Gente, só para que não haja dúvida quanto à minha opinião, eu acho que o mundo ficou melhor sem o Osama. Ou pelo menos, “menos pior”, se é que me entendem. O homem planejou friamente o assassinato de milhares de pessoas que nada tinham a ver com a sua cruzada. Não se tratou de mortes no meio de uma guerra, durante uma batalha. Por mais que não concorde com o conceito, aceito a ideia que militares se matem num campo de batalha, desde que sejam adultos e tenham escolhido livremente e com conhecimento de causa essa profissão.

Mas mesmo assim, não deixo de ficar atordoado com a falta de noção do ser humano, o total descontrole na sua gestão de prioridades em prol da humanidade. Uma sociedade para quem um casamento real é “a coisa mais importante deste século”, para quem o assassinato de um homem é motivo para celebração como quem celebra a vitoria do seu time de futebol, para quem – quem não viu as fotos com Obama 1 Osama 0? Quando nos tornamos tão anestesiados para a loucura ambiente?

Como eu coloquei nas minhas redes sociais: A caixa preta do desastre da Air France foi encontrada, Osama Bin Laden morreu, crianças ainda morrem de fome. E agora o esporte.

O meu problema é que já nem consigo ser cínico com isso tudo. Este é o mundo onde vai crescer e viver o meu filho, uma pessoa cuja existência é resultado da minha decisão consciente e egoísta. Ele não escolheu estar aqui e agora vai ter que lidar com o mundo nesse estado.

Calma, calma. Não estou deprimido... ainda. Um tio meu costumava dizer que um pessimista é um otimista prevenido. É essa a idéia!

terça-feira, 3 de maio de 2011

A loucura da normalidade...outra vez...

Poizé gente. Eu ia escrever um texto inspiradíssimo que falasse ao mesmo tempo do casamento real e do Bin Laden - feitos mais marcantes deste século, mas a minha querida amiga Fernanda já o fez, e muito melhor do que eu jamais faria. Então cliquem aqui e tenham um bom dia. Hoje não tenho vontade de ser cínico. Não consigo.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

E voltamos aos indicadores Ethos!

Indicadores Ethos, ring a bell? Se não souberem o que é cliquem aqui!

Este ano voltamos a fazer o preenchimento. É o segundo ano consecutivo. Sabemos que a avaliação infelizmente não será muito diferente da do ano passado. Pode até ser pior em alguns casos. Existe uma razão para isso. No ano passado, quando fizemos a avaliação pela primeira vez, pouco sabíamos sobre o assunto. A formação de comissões temáticas para tratar de temas tão variados quanto “Governança Corporativa”, “Clientes e Consumidores”, ou ainda “Público Interno” foi um desafio. Essas comissões tinham que ser heterogêneas e plurais para garantir um mínimo de isenção e consenso na avaliação da empresa no seu todo. E para isso acontecer, tínhamos que nivelar o conhecimento dos participantes e incentivar o debate. Ao mesmo tempo, tínhamos de convencer os executivos e diretores que o tempo que esses profissionais passavam/passariam nas reuniões de avaliação também faziam parte do escopo de atuação de cada empregado. A visão mais comum nas empresas é que discutir RSE ou sustentabilidade é falar de reciclagem e plantar arvores; ou seja, nada tem a ver com o negócio.

Decidimos então passar o ano em ações de sensibilização interna para a causa, chamar à participação, mostrar o quanto esses indicadores teriam impacto no negócio. Demos palestras, aulas, criamos grupos de discussão por email para não ser um elemento disruptor no dia-a-dia, conversamos com especialistas da área e com empresas parceiras que se encontram em estágios mais avançados de implementação...enfim. Como costumo dizer, ninguém disse que ia ser fácil. E o efeito da nossa atuação de hoje provavelmente só se verá daqui a 4 ou 5 anos. Imaginem como é difícil trabalhar com essa visão a tão longo prazo! É difícil para nós, para os nossos colegas, nosso chefes...

Depois disso tudo o que conseguimos? Do ponto de vista pratico e pragmático, ainda pouca coisa. Não foram feitas muitas ações concretas durante este ano, até porque a nossa área ainda se procurava, tentava encontrar o seu foco. Não somos RH, não somos comunicação interna, não somos claramente “negócio”, não somos administração, não somos operacionais, e, no entanto precisamos avidamente entender de todas essas disciplinas ao mesmo tempo. Sem o conhecimento e apoio de todas essas áreas não conseguimos influenciar as mudanças necessárias para nos tornarmos uma empresa socialmente responsável e sustentável. É obvio que essa avaliação está fundamentada no conceito do Ethos, mas é a que escolhemos, pelo menos por agora. A prazo seria fantástico conseguir seguir as recomendações da ISO 26000 de RSE, mas ainda estamos longe. Em contrapartida, a nossa maior evolução tem sido esse nivelamento de conhecimento entre os empregados que participam das comissões. Com o conhecimento, os membros das comissões se tornaram mais exigentes, mais criticas. Por isso temos a expectativa de pouca melhoria na avaliação, ou mesmo de conseguir piores notas este ano. Mas esse nivelamento também surtiu um pequeno efeito dominó pouco esperado: mais pessoas ficaram curiosas e se entusiasmam com a missão. E o melhor é que esse sentido critico não é aquela coisa de critica gratuita de quem só vê sempre o que está errado sem propor soluções (tenho a certeza que conhecem esses personagens...). Ele veio acompanhado de uma genuína vontade de contribuir para melhorar.

Em função disso cada comissão ganhou este ano o desafio de melhorar a sua própria nota na avaliação do ano 2011. A equipe de RSE da empresa será o braço operacional do que for definido pelas pessoas das comissões. O preenchimento deste ano, relativo ao ano 2010, será considerado o verdadeiro ano zero. As comissões que conseguirem atingir as suas metas ganharão prêmios. Sim, aprendi que o ser humano é um animal de incentivo. Tenho que saber tirar partido disso. Não importa muito como conseguimos mudar uma cultura empresarial. É um caso típico de “os fins justificam os meios”. A causa é boa. Estou entusiasmado!

quarta-feira, 13 de abril de 2011

O problema são sempre os outros?

Em um dos meus momentos de navegação à toa pela net, dei com este artigo do blog do Instituto Ethos.

Mais do que tratar o tema do artigo – a questão do transito e meios de transporte na megalópoles – eu fiquei interessado pela visão do autor sobre como temos tendência a facilmente nos isentar da nossa cota parte de responsabilidade. No caso das cidades e os engarrafamentos, quantas vezes ouvimos a frase “se os transportes públicos fossem melhores, eu até deixava o carro em casa”? É muito parecida com aquela que eu coloquei no artigo sobre a escola pública: “se o sistema de educação público fosse bom, eu até colocaria meus filhos lá”. É como se fossemos meros observadores pacíficos dessas situações. Aguardamos preguicosamente que alguém ou algum acontecimento tome a iniciativa, mude as coisas para melhor para que posteriormente possamos ser confortavelmente beneficiados.

Isso é diretamente aplicado no universo empresarial também. Já trabalhei em empresas multinacionais, cujos empregados diziam sempre em conversas informais, que os salários eram abaixo do mercado, que as não tinham treinamento, que a empresa não investia neles etc, etc. E em momento nenhum levaram essas queixas para a diretoria de forma estruturada.

Temos imensa dificuldade em nos ver como elementos de um processo de mudança. As coisas não “acontecem”. Elas precisam ser provocadas de alguma forma. É muito fácil apontar o dedo ou levantar o problema. Já propor soluções é mais difícil. Acho que prefiro mil vezes me confrontar com uma pessoa que tem uma opinião contraria à minha do que me ver frente a frente com o que chamo os profetas do apocalipse. Sabem aquelas pessoa que reclamam de tudo constantemente? Esse tipo de personagem é desgastante e ainda por cima tende a ser contagiante... para mal! Ele sintetiza aquele pensamento de Sartre: o inferno são – sempre – os outros!

Mas não. Por um simples raciocínio lógico chegamos à conclusão que se para mim “o inferno são os outros”, então a recíproca é válida e devo com certeza ser o inferno para alguém...

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Do bullying ao tiroteio em escolas

Pode parecer um salto muito alto, mas permitam-me ver uma ligação. E não nada uma ligação obscura oriunda da teoria do caos. É uma ligação relativamente direta e simples de entender.

Mas antes disso, tenho que comentar as barbaridades que ouvi nas últimas horas, muitas vindas de pessoas educadas e informadas. É obvio que estamos todos chocados com o que aconteceu na escola do Rio. É obvio que depois do choque, vem a incompreensão. Já ouvi que é “coisa dos estados unidos”. Outros dizem que deveríamos legalizar a pena de morte. Outros dizem que é a influencia do Islã e da sua retórica “dente por dente, olho por olho” – pelo que percebi (informação não verificada) algum meio de comunicação disse ou informou que o conteúdo da carta que o assassino deixou era “parecido com o islã”. Ouvi ainda que era porque ele – o assassino – era homossexual e tinha HIV. Outros – poucos – dizem que foi o ato de uma pessoa doente. Enfim, parece que todos têm uma opinião sobre o assunto.

A comparação com os eventos dos estados unidos é interessante, como se só lá acontecessem esse tipo de barbaridades. Talvez estejamos agora a descobrir que a realidade é outra. Quem viu o documentário do Michael Moore Bowling for Columbine sobre um tiroteio numa escola do Colorado sabe do que se trata. Infelizmente, os tiroteios em escolas não são monopólio dos EUA. Aconteceram por toda a parte. No entanto, parece ser muito mais freqüente lá, precisamente no país onde a venda de armas é liberalizada. Existe uma relação de causa/efeito? Provavelmente. Estatisticamente, com certeza. É só olhar para os números.

Salvo erro, em finais de 2005, aqui no Brasil aconteceu um referendo sobre esse assunto. Ao acompanhar os resultados da votação, tive a surpresa de ver que em TODOS os estados do país, o povo tinha apoiado a venda livra de armas. Na altura eu estava em pleno processo de mudança para aqui e lembro-me claramente de ter tido um frio na barriga e ter pensado “para onde vou?”. A memória do evento americano estava relativamente fresco e eu me perguntava se assim seria no Brasil. Felizmente hoje sei que, muito embora exista um problema com armas e violência, a realidade é outra, totalmente. Aqui no Brasil não temos famílias inteiras fazendo fila para comprar armas ou comprando balas no Carrefour de bairro. Temos é um fluxo descontrolado de armas indo parar em mãos de assassinos, psicopatas etc, através do trafico de drogas. Isso acabaria se a venda fosse totalmente proibida? Provavelmente não, mas seria muito mais difícil. Basta ver os números dos países onde a venda é proibida.

E qual é a ligação que eu vejo entre o bullying e os tiroteios em escolas? A maneira de ser/estar que é hoje encorajado no dito mundo moderno: competição, vencedores, sociedade de consumo, lógica de mercado que glorifica o lucro a qualquer preço, sem consideração por valores mais sólidos. O meu ponto de vista ultra-cínico e desesperado diz o seguinte: a mesma lógica de mercado ou sociedade de consumo que faz com que hoje seja possível comprar nas lojas Pernambucanas saltos altos e soutiens com bojo para meninas de quatro a seis anos - produtos licenciados e com a marca da Disney – faz que o lobby das armas consiga que o produto esteja em venda pseudo-controlada. A criança começa por pensar que na escola tem de se mostrar a melhor, mais bonita, mais forte, etc. Á medida que vai crescendo banhada nesses conceitos excludentes, vai se convencer que dinheiro compra tudo, que os conflitos são resolvidos pela força, que quem tem mais armas tem mais poder, etc, etc.

Simples assim.

Perdoem a visão apocalíptica. Continuo sob o choque dos eventos. Mas sou definitivamente um otimista. Se não fosse, há muito tempo que teria parado os meus monólogos...

terça-feira, 29 de março de 2011

O bullying, a escola, a família e a sociedade

Há umas semanas atrás no Facebook, um amigo tinha postado um vídeo de uma criança que reagia a um bully, quase que o partindo em dois. O vídeo, extremamente viral, transformou-se depressa em mais um fenômeno de internet, não só espalhando-se por todos os cantos como até sofrendo edições que faziam toda a cena parecer um videogame. A criança, que viemos a saber depois se chamar Casey Haynes foi apelidado de Zangief Kid, em alusão ao personagem do videogame nascido nos anos 80 e chamado Street Fighter.

Uns dias mais tarde, eu recebi um email encaminhado por um colega, com link para este pequeno documentário sobre a criança e todo o fenômeno em que se transformou.

Uma das coisas que me chamou a atenção foi que o email veio de uma “psicóloga, especialista em análise do comportamento, especialista em psicopedagogia” que dizia:
“Penso que devemos - profissionais, pais e, principalmente, escola -, trabalhar com as crianças e adolescentes para se tornarem seres mais humanos, que sejam capazes de respeitar as diferenças e o espaço do outro”.
Bati os olhos no “principalmente, escola” e perguntei-me se era isso mesmo. A responsabilidade de fazer das crianças pessoas não violentas, que respeitem a diferença, pacíficas, conciliadoras, etc é mesmo da escola? Eu sempre pensei que muito do que eu sou hoje é oriundo da educação que recebi dos meus pais, da minha família. Os valores que eles me ensinaram serviram de filtro para muita coisa que a escola me ensinou depois. A minha opinião – totalmente empírica e sem fundamento estudioso – é que a principal referência, para bem e para mal, de uma criança é a família, o pai e a mãe. Se ele ouvir do pai que “na vida o que impera é a lei do mais forte”, provavelmente irá levar esse conceito para as suas relações. Se ele vir que a mãe assume um papel submisso em casa, provavelmente irá achar isso normal e quererá repetir o padrão.

Hoje este fenômeno de bullying está muito na mídia. É interessante observar a forma como é retratado e tratado. Neste caso, uma criança retaliou, após agüentar anos de humilhação dos bullys que cruzava. A primeira reação de qualquer pessoa sã de espírito é de pensar “isso mesmo! Bate mesmo! Vinga-te de uma vez de tudo o que passaste!”. Uma vez passada essa reação normal de quem acabou de ver uma injustiça ser corrigida, vem a segunda reação: a de ver que o bully podia ter ficado muito machucado. Pergunto-me o que teria acontecido se o bully tivesse ficado paraplégico? Já imaginaram?

No final do documentário, quando lhe perguntam que conselho daria para outras crianças na mesma situação ele diz “ foque nos dias bons, mantenha o queixo erguido. A escola não dura para sempre”. Ele não se sente muito feliz pela forma como as coisas aconteceram. Tenho a certeza que, se tivesse a escolha, ele teria preferido não fazer o que ele fez. Por isso não aconselha a ninguém.

O meu comentário: mal sabe Casey que os bullys não existem só na escola. Eu os encontrei na escola, na universidade, no clube de tênis, no trabalho, etc. E a razão disso é que o bullying é apenas um sintoma da nossa sociedade. Eu já tinha comentado isso quando falei da educação inclusiva. Basta um olhar para a televisão – o ópio do povo – para ver quais são os padrões e valores que nos regem: queremos ser fortes, bonitos, inteligentes, ricos, imponentes, agressivos, ambiciosos, custe o que custar. E isso vai até ao nível de como são regidos os países. Se um pais não tem um recurso, vai onde tem e toma à força. Está profundamente errado, isso é mais que sabido. A minha esperança é que a geração do Casey saiba resolver esses problemas de relacionamento que nós ainda não conseguimos.

Ao escrever este texto lembrei-me que uma vez a educadora do meu filho nos chamou para dizer que ele chorava. Nós perguntamos se chorava sem razão e ela respondeu que não, que só chorava quando lhe batiam. Ela nos explicou que o nosso filhote não se defendia. Imaginam a cena? Nós explicamos para ela que ele estava certo, que não era para se defender, que o papel dela, educadora não era de incentivar que o nosso filho se defendesse, mas sim de ensinar às crianças que batiam no nosso filho a não bater.

Felizmente, hoje o nosso filho tem 9 anos e entende perfeitamente a lógica dessa maneira de ser.

segunda-feira, 21 de março de 2011

As mudanças climáticas e os negócios

Há muito que me pediram para falar sobre este tema. Com o recente terremoto no Japão, não dá para protelar o assunto. Estima-se que a catástrofe japonesa custe a bagatela de 35 bilhões de dólares às seguradora. E esse número muda todos os dias. Neste caso, até se trata apenas de um setor que vai ter que cumprir com o que prometeu: indenizações em caso de acidentes, mesmo que sejam naturais. Ou seja, o que probabilisticamente era para ele – o setor – um excelente negócio, acabou de ser a razão da sua morte, no sentido figurado, claro.

Durante séculos agimos com a firme convicção que as nossas ações não tinham consequências para o planeta, que a terra poderia suportar todo o tipo de abuso. Mas sejamos claros. Eu não faço parte dos que acham que a terra tem uma “alma que sofre com os ataques do homem, que se vinga etc, etc”. Mas por mais que eu não atribua essas características humanas ao planeta, não deixo de pensar que todo o sistema que chamamos de “natureza” repousa sobre um delicado equilíbrio de forças, que durante muitos séculos o homem não conseguia influenciar. No entanto, desde a revolução industrial o ritmo de dilapidação dos recursos do planeta deve ter causado com certeza alguma ruptura nessa cadeia de forças. Não tenho dúvida que a terra vai nos sobreviver. Historicamente ela já provou que o seu poder de recuperação é quase inesgotável – vide big bang e outras catástrofes naturais. No entanto desta vez, o período de recuperação pode ser maior devido à extensão dos estragos insidiosos que vimos fazendo nos últimos séculos.

Isso me leva à influencia dessa evolução tem no mundo dos negócios. Aproveitando o “gancho” das seguradoras acima, já vemos um ramo de negócios que é cada vez mais diretamente impactado pelas catástrofes naturais. E pelo pouco que eu entendo da coisa, não era o seu foco de atuação principal. Aliás é só ver os tipos de seguros mais usados – auto, casa, roubo, incêndio, vida, saúde, etc – nenhum está diretamente relacionado com catástrofes naturais. Um exemplo de adaptação do mercado é o aparecimento de seguros contra tufões, na costa norte-americana. Fica-me a dúvida se as companhias de seguros não deveriam investir pesadamente em ações que possam mitigar as catástrofes naturais, como estratégia de sustentabilidade do próprio negócio. É obvio que não será possível evitar a catástrofe por inteiro, mas os efeitos podem ser combatidos.

Outro exemplo que me vem, da influencia obvia das catástrofes naturais nos negócios é na construção civil. No Japão por exemplo, uma área que sabemos ter terremotos, os prédios são construídos sobre sistemas que os protegem contra vários tipos de tremor de terra.

Interessante ver que num caso como no outro – furacão ou terremoto – as pessoas decidem ficar onde estão e encontrar soluções. Confesso que não sei se teria essa resiliência. Depois de ver a minha casa destruída duas ou três vezes por um ou outro, provavelmente abandonaria a região.

Conclusão caótica deste pensamento desorganizado: vamos ter que arranjar mesmo outra forma de viver numa terra que tem dado todos os sinais não nos querer mais por aqui. Já ouvimos falar de todos os cenários catastróficos possíveis. Quem nunca leu que o limite de aquecimento para este século tem de ser de dois graus? Alguns – poucos – dizem que não há de acontecer nada, que tudo ficará bem. Outros – muitos – dizem que temos entre 50 e 100 anos para mudar o nosso padrão civilizacional, caso contrário o fim pode estar mais perto que pensamos. O mais louco disso tudo é que, com a evolução da medicina, 100 anos é do tempo de vida dos nossos filhos. Não se trata de um futuro longínquo que não podemos ainda ver. É logo ali, a poucas décadas de nós.

Enfim, dá para pensar... ou melhor, já não dá para pensar muito. Dá para agir!

sexta-feira, 18 de março de 2011

Olhando para fora: lei anti sindicato?

Como prometido no post anterior, “casulei” durante as festas do carnaval. E no meio do meu bem estar confortável de comida, filmes e música, passei por acaso pela CNN e fiquei chocado com uma coisa que eles informavam. No estado do Wisconsin, acabou de passar uma lei que, pelo que percebi, proíbe a existência de sindicatos e o direito à negociação coletiva. Isso mesmo. É obvio que uma série de organizações já se juntou para que essa lei possa ser impugnada de alguma forma. Vai entrar o jogo político do mais alto – ou baixo – nível, agora. Eu também precisei de um tempo para processar essa informação. A primeira reação foi de me perguntar se o Wisconsin seria o centro do comunismo estadunidense. Se considerarmos que demasiado poder nas mãos dos patrões é um perigo, também é justo achar que demasiado poder nas mãos dos sindicatos não é saudável. Como sempre a solução está num equilíbrio de forças possível, mas difícil de encontrar. Pesquisei um pouco e pelo que percebi o Wisconsin não é a estrela vermelha dos primos do norte. Ao mesmo tempo descobri que o um dos financiadores do dito governador é uma coligação de bancos e magnatas – Koch Brothers, Americans for Prosperity Group, entre outros – que há muito têm uma agenda contra os movimentos associativos, ou “movimentos de prevenção ao negócio”, como eles chamam – eu já tinha ouvido antes esta expressão, aplicada aos departamentos jurídicos das empresa em geral ;)

Pessoalmente, espero que consigam derrubar a lei. Na verdade, mais do que a sensação de retrocesso histórico que este tipo de notícia me dá, fico sempre inocentemente surpreendido por algo assim ser simplesmente possível em 2011. O que vai na cabeça dessas pessoas? Uma vontade de retorno ao tempo dos escravos? Ou um pouco mais tarde, quando do benevolente discurso “trabalha e cala”? É preciso ter uma visão tristemente unilateral e egoísta do mundo, para pensar que tudo ficará resolvido se retirarmos às pessoas a liberdade de lutarem por condições de vida digna.

E fico com um medo de ver uma reação em cadeia do resto do Mundo, se uma lei dessas passa, incólume. Já imaginaram? O resto do mundo tem a mania de olhar com inveja para os estados unidos, pouco faltaria para que começassem a aparecer um pouco por todo o lado, um movimento de retrocesso aos tempos mais felizes do capitalismo selvagem e da pseudo desregulamentação do mercado.

Enfim. Fiquemos atentos...