quinta-feira, 7 de abril de 2011

Do bullying ao tiroteio em escolas

Pode parecer um salto muito alto, mas permitam-me ver uma ligação. E não nada uma ligação obscura oriunda da teoria do caos. É uma ligação relativamente direta e simples de entender.

Mas antes disso, tenho que comentar as barbaridades que ouvi nas últimas horas, muitas vindas de pessoas educadas e informadas. É obvio que estamos todos chocados com o que aconteceu na escola do Rio. É obvio que depois do choque, vem a incompreensão. Já ouvi que é “coisa dos estados unidos”. Outros dizem que deveríamos legalizar a pena de morte. Outros dizem que é a influencia do Islã e da sua retórica “dente por dente, olho por olho” – pelo que percebi (informação não verificada) algum meio de comunicação disse ou informou que o conteúdo da carta que o assassino deixou era “parecido com o islã”. Ouvi ainda que era porque ele – o assassino – era homossexual e tinha HIV. Outros – poucos – dizem que foi o ato de uma pessoa doente. Enfim, parece que todos têm uma opinião sobre o assunto.

A comparação com os eventos dos estados unidos é interessante, como se só lá acontecessem esse tipo de barbaridades. Talvez estejamos agora a descobrir que a realidade é outra. Quem viu o documentário do Michael Moore Bowling for Columbine sobre um tiroteio numa escola do Colorado sabe do que se trata. Infelizmente, os tiroteios em escolas não são monopólio dos EUA. Aconteceram por toda a parte. No entanto, parece ser muito mais freqüente lá, precisamente no país onde a venda de armas é liberalizada. Existe uma relação de causa/efeito? Provavelmente. Estatisticamente, com certeza. É só olhar para os números.

Salvo erro, em finais de 2005, aqui no Brasil aconteceu um referendo sobre esse assunto. Ao acompanhar os resultados da votação, tive a surpresa de ver que em TODOS os estados do país, o povo tinha apoiado a venda livra de armas. Na altura eu estava em pleno processo de mudança para aqui e lembro-me claramente de ter tido um frio na barriga e ter pensado “para onde vou?”. A memória do evento americano estava relativamente fresco e eu me perguntava se assim seria no Brasil. Felizmente hoje sei que, muito embora exista um problema com armas e violência, a realidade é outra, totalmente. Aqui no Brasil não temos famílias inteiras fazendo fila para comprar armas ou comprando balas no Carrefour de bairro. Temos é um fluxo descontrolado de armas indo parar em mãos de assassinos, psicopatas etc, através do trafico de drogas. Isso acabaria se a venda fosse totalmente proibida? Provavelmente não, mas seria muito mais difícil. Basta ver os números dos países onde a venda é proibida.

E qual é a ligação que eu vejo entre o bullying e os tiroteios em escolas? A maneira de ser/estar que é hoje encorajado no dito mundo moderno: competição, vencedores, sociedade de consumo, lógica de mercado que glorifica o lucro a qualquer preço, sem consideração por valores mais sólidos. O meu ponto de vista ultra-cínico e desesperado diz o seguinte: a mesma lógica de mercado ou sociedade de consumo que faz com que hoje seja possível comprar nas lojas Pernambucanas saltos altos e soutiens com bojo para meninas de quatro a seis anos - produtos licenciados e com a marca da Disney – faz que o lobby das armas consiga que o produto esteja em venda pseudo-controlada. A criança começa por pensar que na escola tem de se mostrar a melhor, mais bonita, mais forte, etc. Á medida que vai crescendo banhada nesses conceitos excludentes, vai se convencer que dinheiro compra tudo, que os conflitos são resolvidos pela força, que quem tem mais armas tem mais poder, etc, etc.

Simples assim.

Perdoem a visão apocalíptica. Continuo sob o choque dos eventos. Mas sou definitivamente um otimista. Se não fosse, há muito tempo que teria parado os meus monólogos...

2 comentários:

  1. Assiti a uma palestra sobre bullying e a pprofessora termina o evento dizendo que os valores da sociedade precisam ser revistos. E realmente, precisamos desacelerar o processo, para que criança continue a ser criança, que não entre em depressão por não ter um roupa "da moda".O desenvolvimento social, a tecnologia e todos os demais implementos são necessários hodiernamente, porém, não podemos nos esquecer que eles trazem em seu bojo diversas mazelas que devem ser corrigidas. Não sou favorável ao retrocesso, mas gostaria muito de ver meus alunos brincando novamente com bonecas e carrinhos e não somente se preocupando com o que irão comprar, o que devem vestir para serem aceitos por seus pares.

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  2. Responsabilidade dos pais :) Eu não jogo isso para o colo da escola. É preciso ser coerente. Não é a escola que vai ensinar valores ao meu filho, tenho a certeza. Sobretudo quando ainda por cima a escola pública - LAICA - faz uma reza antes de começar as aulas. Só confio na escola (publica ou privada) para ensinar coisas. O resto é meu trabalho. E mesmo isso ela faz pessimamente. Se eu não tivesse que trabalhar para viver, eu mesmo ensinaria ao meu filho :)

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